terça-feira, 24 de novembro de 2009

O Mito Hoje [1]

O Mito Hoje

Daniele Kovalski[2]

O pensamento mítico é uma explicação da realidade desprovida de qualquer rigor metodológico. Contrapõe-se ao logos, que tenta explicar a realidade utilizando-se de conceitos racionais.
Na antiguidade, o mito ia de encontro aos interesses da aristocracia rural, uma vez que a economia da polis era essencialmente agrária. Todos tinham deveres para com os deuses, as cerimônias religiosas eram obrigações cívicas.
As narrativas míticas respondiam a questões como a origem do universo, vida e morte, condição humana, etc. Assim o mito era a visão de mundo grega, transmitida de geração para geração, durante séculos, por meio oral, tornando-se um aspecto essencial da vida comunitária, pois criava bases para a construção e compreensão da realidade. Com base nisso pode-se pensar de que forma o mito pode ser pensado nos tempos atuais.
Um dos muitos modos de compreendê-lo é pensar na forma que a sociedade enxerga a si mesma, ou seja, na maneira como ela enxerga o aparente como o real. Um bom exemplo dessa espécie de fantasmagoria é a noção que se tem do progresso cientifico. É desse progresso que nós nos alimentamos, nutrimos nossos anseios, ações expectativas e esperanças; porém, em uma sociedade onde o novo sempre é absorvido, onde o amanhã sempre reserva alguma novidade, ocorre exatamente um alargamento das estruturas do sistema, fazendo com o progresso, na verdade, seja uma realidade que nunca se concretize. Ao alimentar nosso imaginário, portanto, o progresso pode ser entendido como um mito da modernidade.
Para o filósofo da ciência francês Gaston Bachelard, o conhecimento científico é um processo contínuo de retificação. Dessa forma ele entende que, na verdade, esse conhecimento é uma constante reforma de uma ilusão.
Outra forma de abordagem da atualidade do mito é questionar o lugar do mito ontem e da ciência hoje, ou seja, qual a relação que os antigos faziam com o mito e qual a nossa relação com a ciência hoje?
Assim como na antiguidade, onde a manutenção do mito atendia aos interesses de uma determinada classe, podemos questionar se no nosso tempo o conhecimento científico e tecnicista não estaria atendendo aos interesses do capital e das elites que financiam a sua própria produção? Vivemos, então, em uma era de culto, do mito moderno da racionalidade?
O filósofo da ciência inglês, Alan F. Chalmers destacou que a alta consideração que a ciência desfruta na atualidade. Sempre que se recorre ao “cientificamente comprovado”, estar-se-ia na verdade, fazendo-se um apelo à autoridade da ciência, ou seja, basta que se recorra a tal para que algo que se diga seja tomado como a mais absoluta verdade. Logo esse apelo seria muito mais uma crença popular, que um método eficaz de impor a verdade.



Referências:
CHALMERS, Alan F. O que é Ciência afinal? São Paulo: Editora Brasiliense, 1993.
[1] Texto apresentado à Prof. M. Rosâni Kucarz da Cunha, para a disciplina de Prática Profissional em Filosofia IV

[2] Graduanda do 4º período de Licenciatura em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná

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